Barulho exclusivo

A administradora recebeu o registro de uma reclamação do condômino do 801 sobre o barulho da noite anterior, de uma festa que teria havido no 802, onde residia uma jovem estudante universitária.

Dizia ele que a festa tinha ido até altas horas da madrugada; muito barulho, vozes e música alta…

No encaminhamento à administradora, o síndico solicitou que se enviasse uma multa à condômina, uma vez que se tratava de reincidência. Mesmo porque, outros registros – reclamando de barulho – tinham sido feitos pelo mesmo condômino, e uma advertência já havia sido enviada à moça do 802.

Da administradora, o gerente responsável pelo condomínio enviou e-mail ao síndico ponderando que, tanto nos episódios anteriores quanto nesse último, não tinha havido qualquer outra reclamação por parte de demais moradores.

E, se a festa tinha sido ‘de arromba’ – como fora registrado – por que nenhum outro condômino se incomodou ou se manifestou? Afinal, eram quatro apartamentos por andar, cem no total.

Porém, o síndico insistiu na emissão da multa, e assim foi feito.

Dias depois, o telefone do gerente tocou; era a mãe da universitária infratora, que residia em outra cidade.

Profissão dela? Advogada!

Um pouco nervosa, mas muito segura de si, ela começou a apresentar inúmeros argumentos sobre a conduta de sua filha: universitária responsável, bem educada, bem orientada em relação aos preceitos condominiais. Disse, também, que sua filha reclamava constantemente do que chamou de perseguição, capricho – sabe-se lá o quê – por parte do vizinho ao lado.

E, para se ter uma ideia, acrescentou:

– Se ela abre a porta do apartamento, ele reclama de barulho. Se, ela entra no banho, toca o interfone. Se ela fala ao telefone, ele reclama.

E tem mais, acrescentou a mãe:

– A festa, citada no último registro – base para a multa – na verdade foi uma reunião com três ou quatro colegas de curso, preparando um seminário…

E arrematou:

– Há fortes indícios, portanto, de que se trata de predisposição contra minha filha, cujo motivo é ignorado…

Complementando, afirmou categoricamente que, além de não pagar a multa, iria ajuizar ação de danos morais contra o condomínio.

Formalizou, então, todo o teor desta conversa em um e-mail enviado à administradora, que foi repassado ao síndico.

Este, refletindo melhor – conforme observadores – cancelou a multa e se desculpou com ela…

skyline sp (18)

Quem mora em ou trabalha com condomínios sabe que um dos problemas mais recorrentes é o barulho, seja qual for sua origem.

O que não significa, no caso concreto, que possamos deixar de lado as boas práticas de gestão, ao observar, diante da única reclamação formalizada, se realmente ‘aquele’ evento ocorreu como está sendo descrito.

Pergunte-se, pelo menos: se foi mesmo um incômodo grande, por que outros vizinhos não reclamaram?

Converse, antes de qualquer providência, com os outros vizinhos. Esse cuidado há que ser tomado desde o primeiro registro, para não correr o risco de se caracterizar reincidência, como o caso aqui descrito.

Sobre Orandyr Luz

Consultor, articulista e palestrante, especialista em gestão condominial. Autor dos livros "Evolução Histórica do Condomínio Edilício", São Paulo/SP: Editora Scortecci, 2013, "O condomínio daquela rua - Histórias e causos nesse ambiente peculiar", São Paulo/SP: Editora Biblioteca 24horas, 2015 e "O condomínio & você - Práticas de gestão condominial", Curitiba/PR: Ed. Juruá, 2018. Ciclista, leitor, cidadão.
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